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Foto do escritorCharton Baggio Scheneider

Parashat Behar 5784

Por: Reginaldo Eugenio Ramos Teodoro


Shalom!


Hoje, vamos explorar a Parashat Behar, que se encontra no Sefer Vayikra 25:1-26:2. Esta

porção da Torá, é de apenas um capítulo (por sinal, este é um dos exemplos de divisões

capitulares que não favorecem a intencionalidade ou a continuidade textual). Um capítulo

único, mas que nos oferece uma visão profunda sobre os conceitos de justiça social, liberdade e sustentabilidade, temas que ressoam fortemente com os valores do Judaísmo Reformista. A Parashat Behar começa com a introdução dos anos sabáticos (Shmita) e do jubileu (Yovel): "Fala aos filhos de Israel e dize-lhes: Quando tiverdes entrado na terra que Eu vos dou, a terra guardará um sábado ao Senhor" (Vayikra 25:2).


No sétimo ano, a terra deve descansar, e no quinquagésimo ano, o Yovel, todas as propriedades retornam aos seus proprietários originais e os escravos hebreus são libertados.

Este ciclo é um lembrete poderoso de que a terra pertence a Deus e que somos apenas seus

guardiões temporários.


Tudo Vem do Eterno


A Parashat Behar nos chama a refletir que tudo vem do Eterno. Cada pedaço de terra, cada

moeda, é proveniente de uma única fonte: Deus. Somos apenas administradores temporários

dos recursos que nos são confiados. Este conceito é expresso claramente em Vayikra:

"A terra não será vendida em perpetuidade, porque a terra é Minha; pois vós sois estrangeiros e peregrinos comigo" (Vayikra 25:23).


Esta visão nos lembra que nosso papel é cuidar do mundo e de nossos semelhantes,

reconhecendo que tudo o que possuímos é apenas um empréstimo do Eterno. Este conceito é reforçado em outros textos do Tanakh, como em Devarim: "Ao fim de cada sete anos, farás remissão" (Devarim 15:1).


E em Isaías, onde encontramos a visão profética de justiça e liberdade: "Proclamai liberdade aos cativos e aos presos a abertura da prisão" (Yeshayahu 61:1).


O Talmud discute extensivamente os detalhes das leis de Shmita e Yovel. No Tratado Gittin 36a, os rabinos discutem as implicações econômicas e sociais dessas práticas, enfatizando a

importância de aliviar as dívidas e restaurar a dignidade humana: "A remissão das dívidas no ano sabático é um ato de misericórdia e justiça."


O Rabino W. Gunther Plaut, em seu comentário ao Chumash, observa que as leis de Shmita e

Yovel servem como um lembrete poderoso de que a propriedade última pertence a Deus e que a justiça social deve ser uma preocupação central da sociedade: "Estas leis destacam a importância de garantir que ninguém seja permanentemente empobrecido ou marginalizado. Elas nos chamam a criar um sistema onde a dignidade e a esperança são restauradas regularmente."


O Rabino Israel Salanter, em sua obra "Or Israel", enfatiza a importância ética dessas leis,

sublinhando que a verdadeira piedade envolve não apenas rituais religiosos, mas também a

preocupação com o bem-estar dos outros: "A verdadeira observância da Torá implica em cuidar dos necessitados e garantir que a justiça prevaleça em todas as esferas da vida. A Shmita e o Yovel são expressões de uma ética divina que nos chama a transcender nossas preocupações egoístas e trabalhar pelo bem comum."


O Judaísmo Reformista valoriza profundamente os princípios de justiça social e igualdade. A

Parashat Behar nos ensina que a justiça não é apenas uma questão individual, mas também

coletiva e estrutural. A prática de Shmita e Yovel nos chama a refletir sobre as desigualdades

em nossa sociedade e a buscar formas de corrigir essas injustiças. O Rabino Abraham Joshua

Heschel, uma figura proeminente no movimento Reformista, escreve em "Deus em Busca do

Homem": "A essência do profetismo é a preocupação pela justiça... a preocupação com o destino do homem."


É importante notar que os princípios de Shmita e Yovel não se alinham necessariamente com

visões político-partidárias atuais. Eles não estão intrinsecamente ligados a comunismo, socialismo, liberalismo ou capitalismo. Em vez disso, vão além dessas ideologias, promovendo uma ética de cuidado com o próximo e responsabilidade comunitária que transcende categorias políticas modernas.


Pontos a Favor


1. Justiça Econômica: A remissão de dívidas e a redistribuição de terras ajudam a evitar a

acumulação excessiva de riqueza e poder nas mãos de poucos.

2. Sustentabilidade Ambiental: O descanso da terra a cada sete anos promove práticas

agrícolas sustentáveis.

3. Liberdade e Dignidade Humana: A libertação dos escravos hebreus no ano do jubileu

reforça a dignidade e a liberdade de cada indivíduo.


Pontos Contra


1. Desafios Práticos: Implementar essas práticas pode ser logisticamente desafiador no

mundo moderno, onde a economia é muito mais complexa e globalizada.

2. Interferência na Propriedade Privada: A redistribuição de terras pode ser vista como uma

interferência nos direitos de propriedade privada.

3. Equilíbrio Econômico: A remissão de dívidas pode afetar a estabilidade econômica e a

confiança dos credores.


Tzedek צדֶֶק


A midá da justiça social, ou tzedek em hebraico, é um princípio central no judaísmo que reflete o compromisso com a equidade, a retidão e o bem-estar de toda a comunidade. A justiça social no judaísmo não é apenas um conceito ético ou moral, mas um mandamento divino, profundamente enraizado na Torá e nos textos rabínicos. Esta midá abrange diversos aspectos da vida, desde o tratamento justo dos trabalhadores até a assistência aos pobres e

marginalizados. Para refletir: Devarim 16:20 (Tzedek, tzedek tirdof); Vayikra 19:15; Yeshayahu

1:17.


Pirkei Avot


1:18: "O mundo se sustenta sobre três coisas: sobre a justiça, sobre a verdade e sobre a

paz." Este ensinamento mostra que a justiça é um dos pilares fundamentais que sustentam o

mundo.


Baba Batra


9a: "Maior é aquele que faz tzedaká do que aquele que oferece todos os sacrifícios." Este

texto sugere que a justiça social é ato supremo de devoção a Deus. Embora tzedaká seja

frequentemente traduzida como caridade, ela se refere mais precisamente à justiça. Envolve a obrigação de ajudar aqueles em necessidade, não como um ato de benevolência, mas como uma responsabilidade moral e religiosa.


Conclusão


A Parashat Behar nos desafia a viver de acordo com os valores de liberdade, justiça e

sustentabilidade. É mais um chamado para “reavaliar”, como diz nosso rabino Jacques

Cukierkorn, em Judaísmo Acessível, “nossas prioridades e alinhar nossas ações com os

princípios divinos de equidade e cuidado com a Terra”.


Talvez um dos textos mais emblemáticos seja do livro historicamente com registros linguísticos mais antigos, o livro de Amós ( עָמוֹס ), que, no capítulo 5:24, discorre liricamente sobre o tema:


"ויְגִַּל כּמַּיַםִ מִשְׁפָּט וּצְדָקָה כּנְחַַל אֵיתָן"


"Corra, porém, a justiça como as águas, e a retidão como um ribeiro perene."


Que possamos, em nossa prática diária, honrar esses valores e trabalhar para um mundo mais justo e compassivo, inspirados pelos ensinamentos atemporais de nossa tradição, indo além das ideologias políticas modernas e focando na essência do cuidado comunitário e da justiça social. Ainda, cotando nosso rabino Cukierkorn, que possamos lembrar que “tudo o que possuímos é apenas um empréstimo do Eterno”, e que nossa responsabilidade é cuidar

uns dos outros e do mundo que Deus nos confiou.


Shalom aleikhem!

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